BRASÍLIA - Durante encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta sexta-feira, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), disse que não abre mão do controle da instituição, e que deseja liderar o processo de reestruturação do Senado. Ele apresentou a Lula medidas administrativas para conter a crise na Casa, reafirmou a Lula a disposição de enfrentar a crise e de não renunciar ao cargo, mas que precisaria, para isso, do apoio do PMDB e do PT; Lula, por sua vez, assegurou a Sarney que terá seu apoio incondicional e que garantiria também o apoio do PT. Segundo a Reuters, nas palavras de dois dos seus assessores, Sarney saiu do encontro "satisfeito".
Vou resistir a esse momento, vou enfrentar tudo. Mas preciso do senhor e do seu partido - disse Sarney, segundo fontes ligados aos dois presidentes.
- Pode contar comigo. O apoio é incondicional. Não tenha dúvida que o apoio do PT eu garanto, fique tranquilo - respondeu Lula, segundo esses relatos.
Ao deixar o CCBB, Sarney apenas acenou para os jornalistas, mas não deu nenhuma declaração. Segundo o colunista Jorge Bastos Moreno, Sarney fez um relato a Lula de todas as providências tomadas por ele desde que assumiu a presidência da Casa e logo que começaram a surgir as primeiras denúncias sobre o excesso de diretorias no Senado. Lula, de sua parte, reiterou que o problema do Senado é um problema político e como tal deve ser tratado. (Exclusivo: Ouça Sarney na Rádio do Moreno)
- Se tiver que sair, ele sai. Não está apegado (ao cargo), mas não acho que isso vai acontecer - disse à Reuters a filha e governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), antes mesmo do encontro do pai com o presidente da República.
" Pode contar comigo. O apoio é incondicional. Não tenha dúvida que o apoio do PT eu garanto, fique tranquilo "
O clima de tensão na família Sarney parece ter diminuído. Tanto que Roseana pretendia embarcar hoje de volta para o Maranhão, para reassumir o governo do estado.
No início da noite desta sexta, Lula reuniu-se com o senador Gim Argello (PTB-DF), escudeiro de Renan Calheiros (PMDB-AL) e aliado de Sarney. Ao deixar a reunião, Argello disse que Lula está "seguríssimo" sobre a permanência de Sarney no cargo.
Renan foi outro que respirou aliviado nesta sexta. Sua avaliação é que o apoio firme de Lula e de Dilma respalda a permanência de Sarney no cargo.
- Está cada vez mais claro o apoio consistente que Sarney tem para permanecer no cargo, que hoje se reflete na postura de pelo menos 54 senadores - ressaltou Renan.
Em jantar com os senadores do PT, na noite de quinta-feira, Lula foi contrário à proposta de licença temporária feita informalmente pelo líder do partido, Aloizio Mercadante (SP). Foi marcada uma reunião da bancada para terça-feira que vem para avaliar a crise e o posicionamento da bancada. (Ouça Mercadante)
No momento mais tenso do jantar, quando o presidente Lula, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o chefe de gabinete do presidente, Gilberto Carvalho, tentaram enquadrar totalmente a bancada do PT, Mercadante pôs seu cargo na mesa, segundo relato de outros senadores.
Juntos, PT e PMDB somam 31 dos 81 senadores. Os tradicionais oposicionistas PSDB e DEM, 27. Há defecções tanto num grupo quanto no outro.
Desde fevereiro, quando assumiu o comando da Casa, Sarney esteve a maior parte do tempo mergulhado na gestão de escândalos que envolvem práticas de abusos de poder, contratação de parentes e apadrinhamento de servidores. Algumas das denúncias foram feitas diretamente contra o peemedebista. Sarney viu seu apoio político ser fortemente abalado depois que PSDB, DEM e PDT pediram seu afastamento temporário do comando do Senado e o PSOL entrou com representação no Conselho de Ética contra ele.
Enquanto Sarney e Lula conversavam sobre a crise, Dilma fazia um desagravo ao aliado e atacava o DEM. Mais do que ninguém, ela quer o apoio do PMDB à sua candidatura em 2010.
Com a ajuda da ministra, Lula teve de enquadrar seu partido, interessado em seguir o exemplo da oposição e defender formalmente a tese da licença temporária.
- Não concordo em demonizar o presidente Sarney e responsabilizá-lo por toda a crise - verbalizou Dilma, em sintonia com o discurso do PMDB.
Com frases contundentes, ela apontou o dedo para DEM, aliado de Sarney na eleição de fevereiro e há anos no comando da primeira secretaria do Senado, espécie de prefeitura da Casa. Todos os contratos e ações administrativas passam por lá.
Segundo o cientista político da Universidade de Brasília (UnB), David Fleischer, foi por intervenção de Lula que seu partido não abandonou o barco de Sarney nos últimos dois dias.
Lula jogou a boia para Sarney. E Dilma também faz parte da equipe de salvamento - pontuou Fleischer.
Para não perder o PT, Sarney decidiu ir para o tudo ou nada na última quarta-feira. Sem rodeios, disse a Mercadante e outros petistas: "Renúncia sim; licença, não". Com isso, jogou para o próprio governo a tarefa de trabalhar pela governabilidade, da qual é importante alicerce.
- Sem o PMDB, Lula não governa. Sem o PMDB, Dilma não tem muita chance (de vencer as eleições presidenciais) - anotou Fleischer.
Ainda nesta sexta-feira, Sarney precisou divulgar duas notas oficiais para explicar uma nova acusação: a de que omitiu da Justiça Eleitoral a compra de uma casa avaliada de R$ 4 milhões.
Primeiro, a assessoria de imprensa de Sarney afirmou que a casa na Península dos Ministros, comprada em um leilão e quitada em 10 parcelas, "permaneceu em domínio do seu antigo proprietário", motivo pelo qual "não foi incluído na declaração do Imposto de Renda de 1998 e, por consequência, não foi informado à Justiça Eleitoral". A assessoria informa ainda que a partir de 1999, a casa passou a constar na declaração à Receita Federal e que, "por equívoco do contador, em 2006, foi apresentada à Justiça Eleitoral a mesma lista de bens de 1998".
Segundo o Blog do Noblat, porém, a lista de bens de 1998 não foi repetida na íntegra em 2006. Pesquisa ao site do Tribunal Superior Eleitoral mostra que as duas listas são bem diferentes. Após a repercussão na imprensa, a assessoria de Sarney divulgou uma segunda nota, explicando que não houve repetição da lista de bens de 1998, mas a omissão da casa, na declaração de bens de 2006, "por esquecimento, depois de feita a atualização patrimonial."
A crise no Senado chegou às ruas do Rio nesta sexta-feira. Capitaneados pelo deputado Chico Alencar (PSOL/RJ), manifestantes protestaram contra Sarney, pedindo sua saída do comando da instituição. O protesto, no Buraco do Lume, tradicional ponto de manifestações políticas na cidade, contou com a maquete de uma cidade fictícia chamada "Sarneylândia, distrito Renânia" (em referência ao líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), feita pelo grupo de Artistas de Rua em Defesa da Ética (Arde).
Neste fim de semana, a maquete será levada para Santa Teresa, onde ocorre o evento Santa Teresa de Portas Abertas. No domingo, ficará em Copacabana, a partir das 10 horas, na Avenida Atlântica, altura da Rua Santa Clara.
Chico Alencar voltou a defender a imediata saída de Sarney da presidência do Senado e criticou o apoio de Lula ao peemedebista:
- Lá da Líbia, ele se empenhou na defesa. Chegou ao Brasil, comemorou com o seu Corinthians, hoje enquadra o PT e negocia com Sarney. Amanhã já está novamente voando e passa o fim de semana em Paris - resumiu.
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